quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Karma

"... talvez a soma dos nossos sofrimentos
torne menos dolorida a nossa dor"
(João da Cruz)


Ele, menino sem dotes financeiros, dava presentes intrínsecos em canções e versos. Era o que ele sabia fazer de melhor e era desta maneira que agradava as garotas, já que apenas as palavras e melodias eram riquezas à serem partilhadas.

Desta maneira ele descobriu as mulheres, como quem absorve com os olhos e com o coração cada letra nas páginas do corpo, foi sendo poesia que ele deu a luz às poetizas escondidas e se desescondeu de seus desejos.

Escrevia sempre
em resposta aos poemas
que lhe tocavam

escrevia como se pudesse partilhar um pouco da angústia que latejava nas palavras alheias, era como se pudesse à partir da dor do outro compreender sua própria dor. Ali lendo as poesias daquelas mulheres que a vida tinha lhe apresentado, era como se lesse a vida de cada uma delas, era como se num livro aberto ele vislumbrasse em entrelinhas as sensações, os sentimentos, o momento que passava a pessoa.

E em resposta, tentava acrescentar a vírgula que a moça não tinha colocado na frase, tentava por a crase e o acalento que talvez precisasse a menina, era essa sua sina.

Devanear carinhos mesmo que distante, era como se lançasse uma flecha penetrante no pensamento delas e contaminasse com sensações opostas as teorias implícitas. Se falavam de amor ele lembrava que ainda existia o abandono, se bradavam contra as misérias sociais ele falava das belezas contruídas pela humanidade, se falavam de vaidade ele trazia a pobreza, se era realidade o tema ele divagava entre sonhos e mitos.

Elas, poucas vezes entendiam que certas poesias tinham endereço em seus corações, mas ele não fazia questão do entendimento deixava que o tempo colocasse o sentido no esquecimento, também pra que pudessem as palavras ganhar novos significados.

Esse seu vício, era um misto de prepotência e amor,
era gostoso de ser vivido,
fazia bem ao muleque atrevido
que não sabia dizer adeus aos amores do passado.

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Se pá!

Vamos supor
que de hoje em diante o sol
não vai mais se pôr

Vamos supor
que a noite não vai mais cair,
suponhamos que não se possa mais sonhar...
suprir

vamos supor, vamos pré supor, vamos se pá supor,
que seja possível separar a dor do dia-a-dia
Vamos supor que quanto mais dor mais alegria
suportemos topor e agônia

Vamos supor que pra sempre seja alegoria
do que nunca é...

Vamos supor José, vamos supor João
que seja possivel sobreviver sem arroz e feijão
vamos se opor à sabatina, a rotina do patrão

vamos sangrar, vamos sorver,
vamos supor supraviver!

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Escritura

Deixei pra ti como herança
uma semente, uma lembrança

deixei de te deixar,
parei de tentar apartar seu sentimento do meu peito

Aprendi a conviver com o respeito
fiz canção sua passagem em minha vida
e imortalizei sua existência em mim

A parcela essencial do fim
que disparou um novo tempo um novo princípio

Enfim... deixei escrito
espero que sempre releia
pra memorar o que nunca deixará
de correr em nossas veias

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Força

Ouvi dizer:
-sinto falta, é fato...
quis responder:
É foda!
quando na real é folha
que caiu na primavera passada
e que ainda agora
alimenta a terra molhada
e faz a árvore crescer
É fácil dizer...
eu sei, mas respeito o fócil
como um arqueólogo
do amor que só entende
a dimensão histórica do que é
através da análise do material
sensível que o compõe...
É fonte, é festa...
movimento da vida que fermenta
e florece...
o melhor da humanidade em nós!

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Estiagem

Há muito que não vejo suas letras,
escondidas atrás de tantas tretas
toda inspiração expira.

Saudade dos sentidos trocados
dos versos malvados que sempre
acertavam em cheio mesmo os
mais despreocupados...

Aquela caneta insana que dizia buscar alento
longe dos tormentos sociais, não me parece tranquila.

já não fala nem de amor, nem de concreto,
já nem fala, calado apenas transmite a mutação

O poeta repousa, e muitos esperam afoitos seu despertar.
pois sabem que algumas coisas apenas ele pode dizer,
apenas sua mente pode pensar...

Em estado de latência
o homem estuda sua existência
e eu apenas aguardo!

Sei que em breve nos reencontraremos
sob os caminhos da poesia,
quando nos tomar de assalto o tempo da calmaria

Quando for o momento, espero rever teus sonhos
que sei não estão mortos.
Apenas navegam absortos em mares bravios.

Ei de rever a renascença do cio,
poesia vivida em fluidez e desvario!

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Esperança ativa

Espero que tenhamos consciência da importância
de nossos braços enquanto eles ainda são fortes

Espero que honremos a vida
em respeitos as inúmeras mortes

Espero que acreditemos em nosso trabalho
antes que nos convençam de que nada mais pode ser feito

Espero que dentre as várias sensações
seja o amor o sentimento eleito

Espero em movimento, como um moinho
que recebe e reproduz os ventos do futuro melhor...

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

MetaDiscurso

Falo pro meu umbigo
num intenso gozo individual
desejo meu discurso,
como quem faz sexo oral

Tato da língua, verborragia,
autoflagelo, texto sensorial...

Chego em meus abismos
pra gritar meu cosmos
e escuto o ego de minhas palavras
no infinito neandertal


Enfim a conclusão boçal:


-Apenas comunico meu pobre instinto animal!

domingo, 17 de outubro de 2010

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Pra você que enxuga gelo...

não se esqueça de levar uma toalha seca,
e não deixe de votar no segundo turno!

Entre a flor e o coturno...

Não teve graça não é?

acreditem muitos vão rir!

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Educa Dor

As vezes parece que estou do lado errado,

pois por muitas vezes não sou o educador,

mas sim o educado

 

Sem ponderações meu coração irracional exclama:

Tá tudo errado, tá tudo misturado…

A minha dor, a dor do outro, a dor do mundo

E eu à educar a dor

 

…aquela dor presente no excesso de trabalho,

na descrença da criança, na falta de afeto

Aquela dor sem graça que matou a esperança

 

Insitentemente, a minha dor a sua dor,

A nossa dor ensaia a dança

Olhares perdidos aprendendo a se encontrar

 

E no buraco da máquina o olho cego descansa,

E vai mirando a paisagem, revigorando a lembrança

 

A velha rua de terra, a barraca de pastel, a fresta do tijolo…

Eu me vendo nesse bolo, eu olhando no seu olho

E no encontro das retinas o horizonte dilatando

 

Novas versões da minha história na memória recriando

No contato barato, o tato faz pensar, dá luz a criação

E a camera, cadela vira-lata, passava de mão em mão

parindo imagens à despeito da condição

 

Olhares gritando a emergência do pensamento confuso

A realidade, o sonho, o abuso!

Tudo junto em profusão…

 

A teoria, a decadência, a instituição!

A sacrosanta esquisofrênia que deseduca, hierarquiza

e nos indica o eterno amém

 

Pergunto:

 

Quem educa quem?

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Licença poética

Foi assim... eu não queria, mas...
foi à força na covardia

algo foi se espalhando em minha essência
e eu já nem sabia, quem eu era, o que queria

Foram sendo sopradas palavras em minha mente
e eu somente decidi, não as guardaria!

Aos poucos fui domando esse novo eu 
que fui me transformando, 

fui pegando do caminho o conhecimento que entulhava 
em minha cabeça e nunca usava

Aprendi a jogar fora o peso do embornal
com elegância e sem dar lição de moral

Assumi que gosto da rima e não da pobreza
e fiz dos meus textos o escárnio da avareza

ainda que as vezes em crise de identidade
pense estar perdido...

Continuo a encontra-la nos corredores 
quando passo em direção ao sono

com sutileza cheiro os seus cabelos e digo com alegria:
-Licença poesia, licença...  

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Conversando com Deus

Meu deus me diga por que não consigo parar de ouvir Sérgio Sampaio?!

Por que fico louco quando escuto Jards Macalé?

Como pode alguém ser tão fã de Bartô Galeno e Rage Against?

Me explica por que sinto vontade de tirar a roupa e sair correndo pela rua quando ouso Edith Piaf?

Onde já se viu achar Gessinger melhor que Buarque?

Por que acho a poesia de Raul mais filosófica que Marx, Nietzche e Jung juntos? 

Me responde Deus, quem no mundo consegue misturar melhor Ritmo e pensamento que Alceu Valença?  

Por que pai, não vou ouvir um som e tomar um vinho ao invés de ficar aqui achando que você vai me responder essas perguntas?

Puxa uma cadeira aí vai, acho que vou ouvir Jethro Tull, 
o que acha? Quer um copo? 

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Garrote














Adentro as tormentas e vago,
devagar e sem pudor dispo-me dos sonhos
e espero recalcado o chacoalhão do despertar

Insitando exitações 
seus olhares me buscam para além das paredes
lúgubres marcas talhadas no corpo
minha seca e suas sedes

Unge as narinas o cheiro tenro
das vaginas da infância
onde bebi o suco da emancipação

Sorver de teus sabores é a meta,
livrai-me destino das setas o caminho prescrito
Quero mais é caminhar como poeta 
num fraseado curto e bonito


Patifaria

Tem coisas que eu sei...
Paty faria, mas eu não!
É questão de classe, 
ela é Paty e eu João.

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Com tato

Pus?

Sinto muito Jesus, 
mas foi você que pediu pra carregar essa cruz

E não me venha dizer: 
Perdoe-os senhor, eles não sabem o que fazem!

Pois eu sei bem dos risco que corro, sei deveras
o quanto morro a cada dia.

Sei das falézias da agônia e dos bosques da felicidade
com tato, com verdade... Por que busquei tudo isso.

E ainda assim não lhe roguei pragas!
Segui sozinho em meu caminho de chagas

Pois é, saiba que cada um germina o que quer
amor, loucura, doença e prazer.

Você não fez jus a caminhada,
pelo contrário essa criança mimada
carregando essa cruz pesada.

Olhe pra você, 
perceba o tamanho da raíz quadrada
perceba o mundo inteiro te querendo 
a pessoa mais amada.

Vai, desintoxica-te dessa dor
para com todo esse sacrificio,
deixa de ser cego, 
não vês que tu é quem sustenta esses pregos?

sábado, 24 de julho de 2010

Lamento passado

Pela fresta do muro dos fatos mirava
pelas pontes do futuro não alcançava,

mas o que procurava?

Procurava mulheres como estrelas,
possuia as miragens pensando te-las
e as guardava em minhas celas
procurando resquícios de mim em suas telas...

Paisagens pintadas no suor de minha aquarela

Pois eu, o errante navegador das constelações,
comia os corações vazios e vomitava amores 
dentre as milhões de flores astrais

Eu procurava em águas razas oceanos abissais...
Procurava!

Já não procuro mais

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Rosa de Chumbo

Essa rosa de chumbo…

assim, singela e perigosa, essa rosa sou eu.

Essa beleza forte, sem rumo sem norte

É tudo que me compõe

 

Frágeis petálas duras e suas memorias escuras

Remetem sonhos e loucuras de outros tempos

 

Rosa viva, embebida no orvalho

das lágrimas derramadas por um coração maior que o peito.

 

Flor que enfeita os feitos do passado e do presente

Adorno de Guerra semente da estória

Primavera da mente, componente da terra.

 

Rosa do agora na aurora do mundo

Botão nascido do chumbo, no limbo e na lua

Avermelhando as ruas no rubro do amor

 

Deflorando consciências pelos becos da cidade

Sugando seivas de solos ricos em verdade

Clamando os sentimentos fertilizantes

Que alimentam as almas dos amantes

 

Essa rosa sou eu!

terça-feira, 29 de junho de 2010

Dilema

Na encruzilhada do Mac Donalds
uma marmita de feijoda repousa como um ebó

E eu, sigo só... Observando a mandinga da sociedade industrial

Eu e minhas lumbrigas 
travando as famélicas brigas do estômago cultural

O poema traz o dilema, 
mas não preenche o vazio

Abemos chester,
pois de certo o problema esta no cio! 


sexta-feira, 25 de junho de 2010

Miserável

Hoje dei o ar de minha desgraça,

Pra que a sua graça pudesse ser mais viva…

Frente à frente minha miséria e sua fraternidade, 

minha maldição e sua vaidade. 

Me desculpe se não sou o que você previa.

Eu só quero não ser esse poço de bondade 

onde mora a cobra esguia.

Vivo assim, 

contrastando minha palidez ao seu vermelho.

Sou seu espelho inverso, 

derramando versos no transbordar da agônia.

Existo pra que seu ego, possa se inflar.

Na derradeira hora em que me salvas à beira do abismo

Sou esse sofista errôneo injetando dúvida 

no seus hormônios marxistas.

Sou a brasa acesa do cigarro queimando o tempo 

num cata-vento de fumaça.

Fique tranquilo, amigo…

a minha dor um dia passa!

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Enigma-Palavra

Meu adverso está contido
em grandes parágrafos de luta

e o resultado é um estribilho
marcado pela dor e pela alegria

Frases de melodia atonal
são elementos do jogral que invento
contra a gramática européia

A identidade do poema
traz na derme o dilema cultural
a filosófica onomatopéia

Pois nem sei quem mais sou
na equação viciada:
Negro-índio-Carapálida

A retórica intrínseca vem como ingua
e denuncia no grito
a malandragem da língua

No meu dialeto a verdade como interrogação:
-Tudo que é desvendado não exclui
a possibilidade da ilusão!

Mais de novo do mesmo velho

Em uma só voz nossos cantos
quantos de nós como tantos,
outros dos mesmos somos,
mas não somamos,
pois limitamos nossos campos,
perspectivas...
quem vende a venda que compramos pra tapar os olhos?
Quem foge a mira?
Por que fingimos não ver?
No senso comum o sonho é de graça,
mas quase sempre é tão caro, é tão raro!
O real é mais fácil
ainda que nada confortável
o desprazer é constante
mesmo que insuportável...não?

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Poder

Podia repetir o discurso cansado e essencial do proletáriado,
podia cantar as canções de ninar das lavadeiras do agreste,
Podia lhe lançar as pragas de morte das profundas do inferno.
Podia ter tido aquele dia o olhar mais tranquilo,
o sorrizo mais eterno...

De tanto poder, não deixei passar batido,
sorri, cantei, bradei, caluniei, observei...
E ainda que nada tivesse feito continuaria assim,
humano como tantos, humano como todos!

Podia e o fui!

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Passarela

Outro dia vi você passar,
sem armas, sem escudos, apenas passava...
Como quem baila sobre a viela,
você passava como quem passa o pincel na aquarela
Aquele passo de passado, de quem conhece o caminho
de quem abraça o mundo com os pés,
Olhava pro horizonte com sede de futuros
com pisadas marcadas que estremeciam muros
Vi você e você nem me viu.
Em sua meta eu não acolhia desejo
e não era isso que queria, ainda hoje não sonho, não almejo.
Apenas te via, e passava, e seguia...
Eu de fato, só pensava em ser pedra
daquelas que geram tropeços, mas nos fazem olhar pro lado!

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Ela fez de tudo!

Ela tentou de tudo!
Gritou na rua, bateu em sua porta, mandou cartas...
Escreveu poemas, textos para peças de teatro, chorou no escuro...
Acreditem, ela fez de tudo,
isso mesmo, ela fez de tudo pra parar de sangrar,
amarrou tecidos, fez curativos, compressas, tomou remédios,
Tomou cachaça, fez pirraça, foi a praça e clamou seu nome!
Mas ele, ele não ouvia!
ela continuou tentando,
Fez promessas, fez simpatias, fez macumbas e outras traquinagens.
Dele somente imagens, só fumaça!
Ficou com raiva, xingou até a última geração, quebrou o quarto todo,
brigou com o melhor amigo,
ela fez de tudo!
sim, ela fez de tudo que existia a vida dele.
enquanto a própria desaparecia!

quarta-feira, 31 de março de 2010

Agora

Eita tempo! eita vida...
Ainda limpo a cara cuspida,
com a mesma água da alma lavada.
Reciclagem meu irmão, reciclagem.
comprimento, compreenssão!
eu ainda sonho, mas apenas quando
posso dormir!

terça-feira, 16 de março de 2010

Íconoclasta

Aqui, agora. Re-trato o corpo que antes distratei.
Distraído em tuas curvas
navego em mim as águas turvas da consciência.

Eram só palavras, era só a mão, a pele, a boca...
já era!

Libertei Pandora e naquela caixa amei quimeras.
Já era, já é!
Paixão descartável como os lençois.
A fé do fogo sobre nós, a vóz...

Basta! Basta apenas guardar na retina
a imagem clandestina da sua carne
uma fotografia que desafia a felicidade.

Frenesi, fuga, afeto, frison...
No som em baixo volume a melodia de outrora
do agora, de tudo, resta a restia de luz neon.
Que da janela destaca em meu pescoço
a cor sangrada do teu baton.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Lama

Luxuriante bebida é teu suor
Ante tua presença meu corpo treme golpeado com martelo de Tor
Seiva bendita em solo quente, refrigerante.
Aguardente dos deuses, embriagante.
Somente sua pele pode saciar minha sede.
Somente teu chão pode guardar minha semente.
Vem, sente meu fogo encandecente
Germina meu calor em teu ventre
E deixa que a transpiração do universo em meu verso te envolva
Antes que em tua espera, em lama a terra dissolva.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

O homem do saco



João, menino de sagacidade nata, sempre soube quem era o tal homem do saco.
Veio construindo o raciocínio de berço. Sabia que era aquele
que por vezes era de dar medo e por outras presenteava. Um tal sujeitinho de roupas grandes e vermelhas,
usando touca independente do calor que fizesse, além de botas pretas parecidas com coturnos de gambés. Barba grande e branca, no rosto estufado. Não era bem gordo, mas tinha muito volume por debaixo das vestes.
Levava por onde andasse seu saco pesado.
Sabia João que o indivíduo tinha um pseudonimo: Papai Noel. Que usava pra ser conhecido nos dias de fazer bem. Questionava-se sobre o conteúdo do saco e tinha uma teoria muito bem desenvolvida. Acreditava que o "bom velhinho", levava um chaminé no saco, para colocar nas casas das quebradas por onde passava, afinal, como entraria pela chaminé, numa casa sem tal alegoria arquitetônica? João adimirava as traquinagens do homem. Dava presentes para que não suspeitassem que era ele o assombroso fomentador de pesadelos. Aquele que puxava seu pé na madrugada mais fria do ano!
João não deixava falhas em sua argumentação, sempre que pergutavam ao mesmo onde o velho levava os tais presentes, já que o saco estava ocupado com a chaminé. Ele marrento dizia: -Debaixo da roupa ué? Ou você achava que ele é gordo como pensam? Como acha que escalaria as casas com tanta banha? Entendia João que o mesmo levava as lembrancinhas por debaixo do casaco, assim teria espaço para levar o estorvo da chaminé no saco para as casas sem o bendito acessório de entrada.
João cresceu, e de tanto receber meias enquanto os meninos da rua de cima recebiam lindos carrinhos de coleção, resolveu se inspirar no velho Noel, mas não cometeu os mesmos erros. Ao invés de levar chaminés as casas, entrava em residências já dotadas do artefato. Não adentrava lares para dar presentes, pegava pra si os excessos de gente que a vida já tinha cansado de presentear.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Pena de poeta

A pena leve dos poetas
Vai escrevendo liras,
estórias de verdades que pra tantos são mentiras

ali, na egregora dos errantes
na encruzilhada dos amantes,
um lugar de nome: “Boca do lixo”
Lugar que bem podia ser um ouvido
de tantas palavras que escutou.
Eram amores, alegrias, lamentos... quantas canções inspirou

Eram dois bohemios e sua forria,
Dois ebrios na noite a encantar estrelas
No caminho da lua, na faixa estreita da rua
Dois e suas palavras mágicas

Homens meninos com a mesma inclinação
de inventar mulheres em poesia,
mesmo que só por um dia, mesmo que pra vida toda

Personagens sinceros no tablado da vida
recitando textos próprios pra plateias desconhecidas
eles, tão fortes e tão frágeis!
Ainda seguem pelo mesmo trilho torto
à espera do trem

triste lira dos amores perdidos,
Linda história que a lembrança traz com as marés
Eles seguem sorrindo ainda que o chão ceda sobre os seus pés.

domingo, 17 de janeiro de 2010

Pedro, Pedra d'agua

Pedro se riu todo
quando o tropeço d'agua
despencou em tempestade
lavando as almas dos homens das beiras.
humedecendo mulheres e ruas inteiras
Bateu asas quando viu em vento
as barracas das feiras mais leves que papel sendo sopradas
Pedro, muleque safado
no ar veio birrento levantando saias e devastando sacadas
e enquanto partia sacou seu bodoque
e deixou seu detalhe na vidraça do coração de Maria
Pedro se ria, pois como um cúpido
corrompeu a menina e foi também corrompido!
Eh Pedro muleque atrevido!
traz na face sempre um riso menino
Pedro, Pedra d'agua
tilintando na superficie do rio da vida
criança sabida...
nunca soube da existência da mágua
sentimento que dele de nacença lavaram...

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Folia de Rei

Fiz rainhas as mulheres que tive,
de reinado em terra, de prendas, rendas e amores.
Sim, as fiz rainhas!!!
Costurei nas linhas do cotidiano
lindos sonhos entre as quimeras da realidade.
Acalentei seus sonos, alimentei, ensinei e aprendi.
Poucas chegaram perto de minha realeza.
Algumas por desconfiança, outras por não conseguirem
algumas por medo, outras por que não permiti...
Das tardes de sol, das manhãs nubladas, fui parceiro,
fui honesto, fui leal mesmo em traição.
Escrevi canções, recitei poemas ao pé do ouvido,
entreguei o meu melhor e por muitas vezes errei,
mas ainda em erro soube pedir perdão.
Lamento em vão, realmente fiz rainha as mulheres que tive!
Respeitei seus defeitos, e as fiz encarar minhas imperfeições.
Paixões, desejos, amizades, eu transformei tudo em flor
e reguei com carinho o imenso jardim
Eu nunca soube fazer sexo, me criei fadado a dar amor
e fiz de cada toque transcendência.
Pra algumas dei minha ausência,
pois foi preciso, pra outras meus excessos...
muitas nem perceberam o quanto as amei,
mas no meu mundo continuo rei
e navego pela vida sereno em minha canoa
sentindo pena das que se mataram com o peso da coroa!