segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

PazCiência

Da quase vida à quase morte
eu tive a sorte da existência,
com suas alegrias e suas penitências.

Ensaiei um milhão de começos possíveis para um conto de renascença, mas dentre os vários
fico com aquele em que o homem se auto avalia e se percebe no mundo como agente do caos.
De todos os caminhos que passei, de todos as mentiras, de todos os amores, de todas as bebidas...
o que resta é esse humano, que no seu desengano propaga o que é, e o que é é esse personagem assumido
que intrerpreta a agônia da vida nos hábitos mais simples. Um jeito específico de amarrar o cadarço,
um tique nervoso, unhas roídas, uma dorzinha chata no dedo médio da mão esquerda quando faz frio.
O cara que se apresenta nessa estória é o mesmo que achava ver de fora as mazelas do existir, mas dali,
das janelas da crítica onde se apoiava pra fazer julgamentos alheios viu o vento feio devastar seu lar.
Mas o que aqui se faz aqui se chaga e cicatriz não é desenho de giz é praga, E taí estampada em todos nós,
cada dor exatamente proporcional ao tamanho da escolha, e de cada escolha a herança do remendo,
um novo ensinamento velho, aprendido com raiva, com sangue.
As vezes em que ensinamos o que nem aprendemos...
Resta de tudo que não pude mudar, de tudo que não quis consertar por preguiça, a reinvenção de mim e a
dignidade de ser esse alguém que não sabe bem o que é, mas respeita o que não quer,
que conhece o que não gosta. Resta a dignidade de assumir os erros, de cuidar dos "peros", de aceitar-se...
Barriga pra fora da calça, postura torta, arrogância morta, contudo vivente, vivo no amor ao próximo,
ao realmente próximo! Pais, parentes, amores, amigos... Eu quero estar com eles em abrigo, sem se esconder,
mas também sem correr perigo. De todos os sons quero escutar o que meu ouvido suporta, quero ler
o que meus olhos dão conta, já fiz minha parte...agora ao invés de produzir arte, quero que a arte me produza,
quero viver poeticamente, não mais mentir minha poética, retórica, sem ética...
Não tenho mais forças pra lutar por exercítos, das bandeira que carreguei resta o peso. E de tudo que pensei
para o fim, o desprezo. Que seja assim, sem fazer mau à ninguém, mas lutando por mim.
Uma guerra travada com o tempo, onde o que alimento é uma paz de guerra, uma pazciência.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Violação

Tenho a impressão de que violei as múmias do Egito,
meu grito está mudo, mas ainda arde a garganta...
e no mais... não adianta, terei de pagar...

Os demônios que outrora pensei ter exorcizado
acordaram comigo.
E perambularão por algum tempo no meu encalço.

No sorriso do inimigo, na fumaça do baseado,
no frasco de perfume roubado, na alucinação eterna do momento.
Da ressaca o sabor indigesto, o espírito do tempo...

No meu brado o sofrimento:
Sai de mim gosto bolorento!
Vai amargar outra saliva, desgraçado sentimento!

A mão do cumprimento é a mesma que cimenta jardins,
A maldição das quimeras caiu sobre mim.
E caída, amei com ela a noite toda!

Estava suja, mas...

Que se foda! Sou desses amantes justiceiros.
Desses que limpam o mundo dos carniceiros.
Por isso cuidado se és desse tipo que vive
em sua razão fazendo só o que quer.

Sou maldito e acabo sempre deixando uma marca!
Não por vingança, não pelas flores que cultivei,
mas sim por esqueceres o nome da mulher que amei,
por sequer seres homem num condado onde só pisam reis!

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

A santa que matou Morfeu

A poesia da liberdade faz morada na boca.
O mel, saliva quente, reflexo.
Mormaço do dia-a-dia em tua pele de fogo,
manta de sonhos em carne nua.
A crueza da vida marca as palavras,
A terra se molda ao contato com seus passos
a lua te espreita negra,
adimira o caminhar...
Vem passar de novo em minha rua,
vem ouvir meu canto,
deixa eu partilhar desejos, te gerar espanto.
Me tira do abrigo, do lugar comum,
me joga no impreciso!
Vem confundir seu suor com o meu,
vem assassinar meu sono com teu sorriso,
com teus santos risos.

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Úlcera

"Quando agente tenta de toda maneira,
dele se guardar, sentimento ilhado,
morto e amordaçado volta a incomodar"
(Raimundo Fagner)
Há muito que escondo,
há muito fujo!
Há muito estou ausente de mim.
De tanto dissimular minha dor,
de tanto camuflar o sorriso...
Virei outra pessoa,
me transformei no meu disfarce
desenvolvi uma úlcera.
Tudo por conta da minha arrogância!
Quis demonstrar força,
mas esqueci que sou humano.
Tudo pelo meu excesso de cobrança!
Até enganei alguns,
mas quem me conhece sabia,
sabiam o que eu escondia,
um amor, uma cria,
um sentimento gigantesco
varria as ruas desabitadas da alma
Agora é tarde, de tão crônica a enfermidade
o que resta é o aprendizado do convivio,
convivio com meus erros, convívio com a angústia,
convívio com a memória do que fui...
tudo isso em meio a breve esperança de me reencontrar,
afinal já não há mais fantasia pra esconder-me.

domingo, 6 de dezembro de 2009

O adorador de abismos


Na arte de viver sou amador.
Daquele tipo que vive na eminência do fim
fazendo valer todos os segundos do tempo,
como se cada momento fosse o último.

Sim, sou amador!
amo tudo em demasia,
como se precisasse guardar a lembrança do mundo
no final de cada dia.

Como se dessa maneira pudesse adiar a despedida,
como se fosse possível enganar a morte.

Assim à muitos anos meu ritual se faz
no culto das memórias vivas à beira do abismo.

Meu templo é o limite da existência
e é nesse lugar que pago minha penitência
fazendo diariamente minhas ultimas preces
e acabando que sempre vendo um novo amanhecer.

Como se a morte alterasse seus planos
pra me ver correndo atrás da vida na alvorada seguinte,
como se ela, a morte, tivesse esperanças
de me ver completo na experiência humana.

sábado, 21 de novembro de 2009

Erudição Popular

"A ciência é a poesia que não deu certo"

Vejo no olhar do povo sua verdade, seu sacrifício, sua clausura
Vejo sua ignorância e sua beleza, nada diferente da minha,
ouso em sua fala sua expressão agregadora,
sua comunicação sem rédeas, sua falta de disciplina.
Sinto no suor desses meus irmãos
a luta e a construção, a transformação do imaginário.
Medito as tradições desta gente,
o conhecimento ancestral e nunca estático,
o canibalismo mutante e criador do aprendizado.
Sua ciência de terra nunca melhor que a dos livros,
mas também nunca pior!
Diferente e possível, vital e tangível, a letra,
a fala, a imagem da dor,
do amor, da vida simples e caótica por natureza,
daí sua beleza, sua trilha rumo a liberdade,
seu potencial evolutivo ...
Por isso quero que minhas palavras tornem-se ditos populares,
pra que nunca ultrapassarem a proporção de palavras,
pra nunca aprisionarem a autonomia de ninguém,
pra que nunca possam castrar o pensamento,
só assim não sendo mantras é que terão sentido
e serão sábias por consequência e sequer minhas...
Serão poeiras de sonho na mente de todos que ainda puderem sonhar.

Na casa onde moram os medos

-Posso te contar um segredo?
O olhar era de medo e de coragem ao mesmo tempo. Difícil de conceber, mas era exatamente assim. Não olhava diretamente nos olhos, mas trazia na voz um desejo de confissão sangrada, das confissões que se precisa ter coragem pra dizer, por mais bobas que possam parecer ao outro. Então eu disse:
-Conta.
Também estava com medo, porém percebia ser um medo diferente, daqueles medos de ter que ser sincero. Ridículo né? Mas existe, medo de ser sincero…continuou:
-Não sei se devo.
Exitava pra testar se realmente valia dizer, o que é bom, afinal não se conta um segredo pra quem não o dará o devido valor, pra quem não o guardará com o respeito necessário.
-Conta eu quero escutar. Enfatizei.
-Lá vou eu de novo me adiar no processo que estamos construindo. Disse ela me encarando.
Senti nos olhos dela a história dos seus anos, suas dores, seus anseios…Os olhos são as portas do inferno interior de cada um e só se pode ir ao paraíso atravez dessas passagens. Eu queria dividir a visão do meu inferno com ela, mas assim como ela, eu também tinha medo.
-Acho que eu…
Conteve-se e me deu um beijo bem de leve.
Como quem mede a temperatura do lábio para medir a temperatura da recepção do que diria. Afinal não há medo no dizer, mas sim medo no como receberão o que dizemos.
-Pode falar!
Disse firme, mas inseguro. A insegurança é a condenação de quem será posto à prova.
-Acho que eu estou…
Parou de me olhar nos olhos, por um segundo pensou em não mais me dizer. Pensou: “E se ele for como todos os outros?”. Ela não tinha medo da minha estranheza, mas da minha semelhança.
-Acho…
Segurei de leve o seu rosto e a obriguei a me olhar nos olhos novamente.
-Acho que eu estou completamente apaixonada por você!
Disse como quem tirava uma cruz das costas e na sequência já ia se justificar, mas interrompi.
-Eu te amo.
Disse me desarmando, como quem relativizava e sentia incompletude no que ela havia dito.
-Qual a diferença de estar completamente apaixonado e de amar?
Ela sorriu com o canto da boca e olhou tão profundamente nos meus olhos que eu me senti invadido, provei do meu próprio veneno e tive medo. Eu que sempre estava à olhar todos de frente e com segurança, titubiei e me entreguei como quem desvirginava um novo mundo. Ela com tom surpreso e feliz respondeu:
-O tempo?
Falou como quem blefava com cartas boas pra jogar. Eu retruquei:
-Mas como prever o tempo limite entre a paixão e o amor. São nomes, são só nomes!
Eu dizia algo que ela já sabia e pra nós dois só precisava ficar mais explicito. Insisti:
-O tempo é relativo, podemos construir amores e paixões breves ou grandes sentimentos, não é? Você mesmo já me disse isso lembra?
Ela disse estar mais leve e eu fiquei a observar seu corpo deitado sobre o meu.
Nos apresentamos aos nossos infernos e o paraíso já podia vir. Foi quando ela encerrou:
-Será que era mesmo um segredo?

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Segunda - Feira, 18 de Março

Não é o dia de hoje,
não é questão de tempo
escrevo com a dor do ontem
o passado advento.

Sem muito o que dizer
regeito o que escuto,
assim, docemente bruto.
Uma anomalia,
a cria de Roberto Piva e Saramago.

Sou aquele que mata quem mais ama
só pra ver morrer um pouco de si
no meio do estrago, um mago!

Meio menino,
meio homem,
meio pedra,
meio mar...

Hoje resolvi te abandonar e morri
o calendário esqueceu de contar.

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Nosso mundo, nossa língua, nossa reza

Nos seus olhos,
o mundo, meu mundo
olhos nús
Quando te olho
num segundo
a escuridão vira luz
A volta do corpo
o sentimento fecundo
uma volta no mundo
meu braço em volta de ti
Da altura dos sonhos
num abismo profundo cai.

Amor...amor não doe
quando a queda é pra dentro de si

Não há palavras pra descrever
quando a língua percorre o seu corpo
nas curvas, nas vias no reto, no torto
Meu dialeto morto conhece o esperanto do teu ser
E ali espera morrer
na entrega vertiginosa
no descobrimento do que até então não conheci

Amor...amor não doe
quando a queda é pra dentro de si

Nossa reza
nossa ligação com o divino
o suor no suor, a invenção do destino
Orixás e xamãs
haverão de invejar
nosso amor sagrado
nosso vôo sem ar
do colo de deus
em seu colo cai

Amor...amor não doe
quando a queda é pra dentro de si

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Meia noite

Às vezes eu tenho a impressão de poder tudo!
Faço poemas, escrevo teorias, interpreto peças, vou até a lua...
Mas ao mesmo tempo quando olho pra rua, nas coberturas dos bares
os mesmos homens sem lares,
as mesmas feridas sociais incicatrizáveis.
Percebo que tudo que eu queria
era que aquele cara não mais passasse fome,
mas isso que se resolve aparentemente tão facilmente,
esse mal sem nome, esse grito estridente
é o redemoinho demente do insustentável.
Minha poesia não o tira da rua, minha teoria não resolve sua vida.
Eu tenho que chegar meia noite em casa
e quando passo na avenida, interpreto minha angústia,
divagando sobre a questão mal resolvida.
Faria muito mais, se não tivesse que chegar meia noite em casa!

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Pra que a doçura não me cegue

Nos sarcófagos d`alma meus demônios nunca dormem
sempre abraçados a minha sinceridade, riem das feridas alheias,
cospem nas seias dos patrões.
São esses diabos moradores do céu da minha boca
os vomitadores das falas pesadas que amassetam corações,
são os vilões da sociabilidade,
aqueles que amam a dor e doem de tanto amar.
Flores que a esperança esqueceu-se de murchar
no outono da existência.
Os portadores do meu mal necessário
alegorias da demência.
São esses em mim as pombas giras da visão,
pra que na alvorada da paixão
a doçura não me cegue!

sábado, 15 de agosto de 2009

Deste lado



O que sinto por você...nem sei dizer,
poderia descobrir se tivesse tempo pra entender,
poderia mentir se percebesse
que isso tornaria as coisas melhores.
Mas pra variar, você não estava preparada pra sinceridade,
como muitas outras mulheres.
Você não estava preparada pra dúvida,
não estava preparada pra verdade residente na incerteza,
não podia perceber a beleza do que o tempo pode nos dar.
Sementes ao solo, flores começando à rasgar o chão.
E você a jardineira de pés de aço e alma de fogo,
quis discontar em mim (uma muda de sonho)
toda dor que o mundo lhe causou
pisou no meu corpo, dilacerou o breve arbusto que crescia.
Que nome dar pro sentimento, eu nem sabia!
Mas provei o fél de sua agônia, entendi...
Era sua dor e quem era eu pra ser diferente.
A dor de séculos contra a dor do presente!
Compreendi que as vezes jogamos sementes,
mas não estamos preparados pro que pode nascer
Deitados sob as folhas de uva ouvi você dizer:
"isso não é delirio. é dança,
não é vinho, é vingança!!!"

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Minguante



Quando pensares em ter pena de mim,
insisto: Não se preste a esse papel!
Sigo minguado e sorrindo, como a lua no céu

quinta-feira, 23 de julho de 2009

Retessência


Ele não morreu!
Apesar da aparente falta de alma,
ele não morreu...
Tivera ouvido que quando morre o sonho, morre o homem,
mas ele sobreviveu, afinal era tudo que lhe havia restado.
Referências de caminhos, cicatrizes abertas...
Nele persistiu a vida,
como uma árvore de beira de avenida
acinzentada, mas de pé, uma aberração...
Era no livro da história uma reticência,
uma daquelas pontuações que só se gosta pela insistência
não tinha vocação pra exclamar, mas estava vivo...
Dizem que só não morreu,
por que encontrou na falta de sentido
o significado de existir...

continua!

quarta-feira, 8 de julho de 2009

De mim

Sobre os escombros de vida, margaridas.
Almas falidas são ventos distantes
aos errantes vendavais de corações libertos.
Corre menino! Vai menina!
Inspirem a sina de estrelas cadentes ao beijarem o mar,
ensinem os velhos discrentes que ainda se pode amar,
diga as verdades sem medo que os adultos
não aguentam escutar...
Algodão doce no ouvido, formiga em caixa de fósforos,
para-quedas de sacola de mercado, bolinha de sabão.
Teime criança! Não aceite facilmente o meu não!
Não deixe que minha ansia de proteção apague sua chama,
continue levando escondido a lagartixa pra cama,
pois quem ama como pai se esqueceu do quanto é vivo
o fogo que arde dentro de ti.
Por isso queime: fogo, fagulha, faísca, fogueira...Queime!!!
E não mate seus sonhos mais belos
em lutas de video-game.


Para o eterno residente da morada do meu coração,
meu filho, João Bach Fagundes Gusmão.

Amante

Sinto falta de um amor possível,
ultimamente tem sido impossível a possibilidade de amar
cabeça cheia,
coração vazio,
de todas as fontes que bebo
em nada me sacio.
Mas em algum lugar deve existir
uma alma tão revolta quanto a minha,
dando linha pra pipa do futuro.
Espero que bons ventos
tragam seu mandado
pro lado de dentro do meu muro.

quarta-feira, 29 de abril de 2009

Pecado Capital

Decadência dos valores, amores brutos, os putos de esquina e sua sina libidinosa, os amantes do haxixe, os assassinos sem escrúpulo, os psicopatas e sua lábia venenosa, sim...os invejo, todos os boêmios, poetas de rua, os infratores da lei, aqueles que tomam a vida de assalto, admiro as peruas de salto alto caminhando na paulista, digo que não, mas também quero a modelo da revista...Ahhh inveja sem cura, dos filhos de Baco, adoradores do vinho, os cristãos rebeldes sem coroas de espinho, queria ser por um dia uma beata em sua santa castidade e na manhã seguinte ser uma vadia dando o cú de graça num cantinho, queria ser cão, ser gato, ser homem, ser flor, ser a eternidade, ser deus e ser diabo, ser pão, ser partilha, ser pastilha de hortelã, ser Bodelaire...derramando sua visceralidade lentamente sobre a folha branca da moral, somos tão puros dentro dessa nossa liberdade sem rédeas não? Somos isso, essa coisa feia e bela, essa agressão singela, e tem mais, aos militantes de plantão uma revelação: -Somos todos culpados, Che está morto amigo, faça sua revolução!!! A sociedade não seria outra se não assim, já é, já está feito, por mais dolorido que seja, a história não perdoará ninguém, não que todas as lutas até aqui tenham sido em vão, mas o que vale agora é saber o que faremos a partir de então... Apesar da cultura que tenho, do empenho em meio a literatura vasta, percebi que até minha negritude já não me basta, minha descendência indígena já não é escudo, meu RG foi queimado num ritual pseudo-pagão e eu estava mudo. E assim desprotegido de mim, escavei os segredos encobertos em minha identidade e escancarei minha culpa católica Européia, também tenho o sangue dos estupradores...Demorei, mas descobri o quanto pesa a cabeça tanta razão, o quanto aniquilei meus sentimentos na utopia cega da transformação, mas...transformar o que, transformar a quem e por que? A partir de agora estão expulsos de meu pensamento os que pensam em salvação, Ninguém precisa disso, na verdade sou eu quem vive em agonia, reparei sob os escombros da indignação que meu coração ainda batia, hoje, apesar da entrega aparente, faço auto-terapia pra perder o medo de amar. Por isso calem-se senhores da inverdade, engulam suas teorias, os do povo, os da academia, todos! Prefiro uma valsa solitária a beira do abismo, o mergulho em mim, pois não quero doutrinar ninguém, sigo meu caminho aquém das varizes sociais, bebo da água de esgoto que eu mesmo sujei, como do lixo que nós todos produzimos, e eu sei, é dolorido dizer isso, mas repito SOMOS TODOS CULPADOS!!! Sim, somos sim e não precisa disfarçar... Lembra você ECOchato, jogando aquele papel de bala pelo vidro do busão, lembra você revolucionário de merda batendo em sua mulher em casa, lembra você feminista panfletária escondendo a inveja da moça semi nua no cartaz de cerveja e você vegetariano padrão, cidadão modelo, fingindo não sofrer ao ver a picanha fritando na brasa, na cabeça a dor de uma cachorro em frente a máquina de frangos e no pé um tênis de uma marca qualquer que com certeza alimenta o capitalismo tanto quanto eu, e ainda assim se acha superior, acha que esta fazendo a reforma do pensamento...Assim considerando essa culpa evidente, podemos ao fim descobrir que não temos culpa de nada... Será?
Por tudo isso concluo: além da sociedade de classes, além dos muros, da disparidade dos discursos, talvez a única coisa que nos torne iguais seja a mãe de todos os pecados capitais, nossa majestade: A ignorância.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Árvore

Um dia me julgou infantil,
disse que eu não tinha rompido com o cordão umbilical
que me prendia a minha mãe.
Esbravejou de boca cheia dizendo ser independente,
mas escondia atrás do berro a menina sem rumo, a princesa decadente.
Eu mirava em ti o jardim vermelho de sonho utópico
onde as sementes floresceriam plenas numa linda primavera de praga.
O tempo passou e as flores murcharam.
Eu me descobri árvore, crescendo e pulverizando no ar
a minha contribuição pro futuro,
enquanto você sequer vislumbrava o que havia além do muro.
Pois é, não me desconectei da minha história,
você tinha razão, um forte cordão me liga a eterna pachamama
como toda árvore que se presa, com suas raízes bem fincadas no solo
com os braços levantados pro céu e a cabeça tocando as nuvens
o tronco ligando a razão ao imaginário,
muito diferente do campo binário onde você com você mesmo prefere viver.
Sim, sou árvore, maduro e consciente
sigo o caminho ancestral guiado pelos antepassados
com amor e não adornos, nossos velhos são sábios por natureza
e nossa beleza não é plástica.
Sua morte alimenta a existência do meu povo,
seus nutrientes enfermos são suavemente filtrados por nossas raízes.
Riqueza, jamás, só o básico pra continuar a partilha.
E assim quando a trilha me chamar pro além mais,
morrerei de pé, definhando até a última folha
e reciclando tudo que meu corpo puder doar
pra quem quiser, pra quem rasgar...
o sublime ventre da mãe terra.

segunda-feira, 23 de março de 2009

DIVINALUZ

E Deus disse:
-Haja Luz!!!
E Luzcifer...

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Sujeito oculto

No começo eu não queria acreditar, olhei pro meu corpo e fingi não ter entendido, não era possível que tivessem feito aquilo só por causa de uma olhada. No fundo, eu sabia desde aquele instante, mas foi difícil, imagine que depois do acontecido eu fui tentar explicar pro povo que eu não tinha feito por mal, foi só uma olhadinha sem compromisso, ela era linda e eu não sabia que estava acompanhada, ninguém me deu atenção, eu parecia não existir pra ninguém ali. Poxa, no meio daquele calor, cuíca, pandeiro, agogô, umas breja na cabeça... o suingue dela me ipinotizou e acabou dando no que deu, enfim demorei, mas compreendi, era samba, era favela era a mulher do Cirílo e ele tinha que cobrar a treta, ia ficar tirado na quebrada se por um acaso alguém visse que eu tinha olhado pra sua mulher, o que iam dizer na biqueira no dia seguinte? Porém foi um pouco exagerado né? Podia ter me dado umas porrada e já era, teria sido suave, uma surra em troca de um sorriso "e que sorriso", ainda bem que ele só viu eu olhando pra ela e não ela também olhando pra mim, pois se assim fosse tinha sobrado pra ela também, menos mal teria sido uma surra em troca de um sorriso, nada de novo só o que a vida já faz com qualquer um dessa quebrada diariamente, uma surra em troca de um sorriso. Mas não foi assim, o desgraçado sacou o trabuco e foi pipoco o medidor da treta, foi feita a merda, o samba parou, a rapa saiu correndo, instrumentos caindo no chão...que pecado! Comigo tudo bem, qualquer coisa eu topo, mas aquele dia o pandeiro foi maltratado, tamborim descompassou, o surdo ficou surdo com o estampido da bala, a dança, a reunião de gente em melodia comum foi interrompida, o samba não pode ser tratado desta maneira, jamás!!! Essa foi minha maior dor naquele momento, essa foi minha minha maior perda...
Depois daquele dia o samba demorou a voltá, a polícia ficava urubuzando a área e a galera ficava com medo, eu que já era marrento, depois daquele dia fiquei mais ainda, peitada os cusão e mandava corrê, mas num surtia muito efeito, eu fiquei meio invisível depois daquela noite, todo mundo passava desapercebidamente por mim e pouco me davam aouvido, a mulecadinha que jogava bola na ruinha de trás, ali sabe, onde a frieira encontra a guia, onde a gritaria faz todos parecerem mais vivos, nem ali eu era notado. Mas de tanto infernizar indo na casa dos sambistas toda noite, eles acabaram se enchendo. Foram devagarindo chegando no terrero, voltou meio tímido o batuque, mas voltou e graças a mim. Tá certo que as vezes eu tinha que pegá na mão do Zeca quando o tamborim parecia tá meio devagar e dava energia pro negócio, o coitado até suava frio, as vezes o surdo ficava fraco e eu grudava na baqueta e ajudava a porrada do Zezinho ser mais ritimada, assim seguia toda noite de sexta e sábado, eu como já era de praxe nunca era lembrado, mas vira e mexe ouvia alguém dizer pra algum dos músico: - Hoje você tava inspirado hein?! E o pior era as resposta dos ingrato dos músico dizendo: - Sei lá, senti uma força vindo num sei de onde e me tomando o corpo, tá forte o samba hoje! Era assim, mas tudo bem, ali a única majestade tinha de ser a música.
Todo mundo ia embora lá pras hora que amanhecia, lá pras hora que o pé da judite, a passista mais nova começa a doer, eu podia ficar ali por séculos, mesmo vendo todo mundo ir embora sem me comprimentar, mesmo vendo um falando mal do outro pelas berada, era ali minha morada meu recanto sagrado. E se quer saber, depois de tudo sozinho no terrero é que eu sentia a melhor parte do momento, aquele bafo quente misturado com a poeira do chão, aquela atmosfera de paz deixava guardado no ar os melhores sonhos das pessoas que por ali tinham passado, parece que só eu via aquilo. Até que um dia enquanto o Tijuca chamava a saidera no samba, eu vi a dona Sofia no meio da multidão, tava olhando pra mim, logo ela mãe do Cirílo ele que tinha tornado minha vida naquele descaso, ela benzedera das arruda do barranco, logo ela!!! Pensei, será que tô fazendo algo de errado? Fui até ela e me ajoelhei, pedi bença, ela disse: -Deus te abençoe meu filho. Fiquei muito emocionado, foi a primeira pessoa que falou comigo depois daquele dia fatídico no samba, eu já tinha até me acostumado com o meu pecado, com a minha exclusão, parei o samba aquele dia e o samba parou minha vida, porém ali do lado daquela sábia mulher me senti de novo mais um da família, me senti perdoado sem que ela dissesse uma palavra a mais, o olhar dela erradiava luz e me dizia algo que eu mesmo sem entender sabia que era bom, aquele dia eu fui embora do samba mais cedo.

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Ruínas de Gente

Do pó viemos,
ao pó voltaremos
Se for fogo queimaremos,
se for água beberemos...
No fim uma coisa só
poeira de vida, reconsumida, renascida
Veremos, é o fim de todos
sem amos, sem remos
no silencioso mar
de infinito sem contorno
o eterno devir, o eterno retorno