sábado, 15 de fevereiro de 2020

Kura

Kalunga não começa nem finda,
afunda
fenda no tempo
acaba,
inunda
principia outra vez
Alias o infinito deitou de novo
deu 8 voltas
em volta
do mundo, esqueceu do seu povo
engoliu o kimbundo
a cada morte, a cada segundo
seguiu.
E eu fiquei medindo a saudade
profunda
e se é terça ou domingo
não sei
todo dia parece segunda
Queria mesmo é poder
só te amar
e me curar da caxumba

Vás

Vaz, caminha...
pero no quieres que lo sigan!
O Quixote das ruas segue rumos incertos
e quase sempre se encanta com flores maltrapilhas
que só nascem nos desertos
Vaz, não realiza viagens colonizantes,
pelo contrário, segue junto dos errantes
bradando contra os opressores
O poeta ancorou-se na quebrada
de onde escreve cartas aos reinados de além mar, praguejando os invasores
Vaz, podia ir, mas não foi, preferiu ficar
pra lutar ao lado de gente ferida
carente de poesia e de sentido pra sonhar
E quando alguém perde a paz ele é quem sempre diz: Vás!
Caminhas com suas próprias pernas! Enxerga a luz aquém das trevas!
Sergio não descobriu a periferia
mas revelou o que sentia
o coração dos ancestrais.
Por isso hoje, quando ele sobe sua pipa pra enfrentar os vendavais
eu vou, tu vais,
nós todos acabamos indo atrás!

E agora Jão?

Ei Jão já se imaginou sem futuro,
olhando cego o horizonte sem tradução?
Já pensou Jão?
Atinou o desproveito de tudo que ergueu?
Já tirou onda no breu?

Já se viu apartado de quem ama?
bebendo o pranto alheio do outro lado da vida?
Lambendo ferida, tipo cão de rua? Já?
Sem leme, bagunçado, sem diagnóstico?
Já esmirilhou magrugada sem explicação?
Qual será a derradeira palavra?
Já quis sim, pedindo não?
E agora Jão?
Agora tem medo?
Já pediu perdão? Já perdoou?
Nunca se tinha imaginado indo?
Pensou-se eterno foi?
E agora?
Num orgulhava-se de ser último?
no bar, na festa, no trampo...
E esse Sarampo? Quem te deu?
E agora Jão?
Mudança ou caixão?

segunda-feira, 7 de outubro de 2019

As crianças já não querem balas!

E foi a Ágatha,
antes tinha ido o Kauan,
depois o Kaue,
dia desses passado outro Kauã, esse do Rosário,
não deu tempo de fazer prece,
deus não chegou no horário.
Noutra manhã foi o Diogo,
E um mês atrás foi a Jeniffer Gomes
E tantos outros nomes infelizmente ainda irão
crianças pobres, pretas...
que pra eles não valem um tostão!
E sabe o que é pior?
Não foram as crianças que inventaram a guerra
Não foram não!
No vão dessa inconsciência resplandece o breu!
Eu acendi uma vela,
Vanessa incendiou um pneu,
Cristovão ateou fogo no colchão
e Raquel deu sua contribuição
pra enorme fogueira da rua
antes dela mesma deixar-se ir também
Num banzo ancestral,
numa tristeza sem amém.
O mais medonho
é que não adianta apelar pra sensibilidade das pedras
Na frieza nem conseguem imaginar
que poderia ser talvez o filho delas
Afinal as balam perdidas tem endereço
os sonhos soterrados tem um propósito
e o futuro esfarelado tem sempre um preço!
É chegada a hora de irmos com eles,
a hora de enfrentar essa paz miserável
ainda que nos custe a vida
não dá mais pra achar isso tudo aceitável!

sexta-feira, 28 de junho de 2019

Herança

Com a tinta de mainha
painho pintou a minha pele
numa cor muito bonita
um tanto mais escura que a dele
Com as mãos de painho
mainha fez brotar música nos nossos caminho
e desde então nossas alma nunca mais se entristecero
E foi a garra de voinha que inspirou
tanto mainha, como painho a
serem criativos nos dias de escassez
e desde então ninguém mais fez
promessa contra a fome
com as luz dos zói das minhas cria
eu iluminei a estrada
e trilhei um rumo de alegria
onde eu nunca estivesse sozinho
com o amor da companheira
fortaleci a envergadura
e desarmei a armadura
pra aninhar os passarinho
E com as asas do coração
eu voei baixinho
entre os espinho de roseira
e o algodão dos teus carinho
hoje eu sei que
o mundo é bem pequeno
quando nois tudo tamo perto,
assim bem juntinho....
Não há distância pro abraço
nem palavra sem padrinho!

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2019

QUEM SOMOS

A gente sabe das coisas e as vezes é tarde demais pra aproveitá-las, 
a gente sabe das valas e as vezes é cedo demais pra conhecê-las.
A gente quer ter espírito e as vezes é tarde demais pra acender velas.
A gente quer ir além das querelas, mas não consegue desapegar das migalhas.
A gente quer que o barco vá, mas não estende suas velas.
A gente quer voar, mas não espera amadurecer as asas.
A gente quer ver além, mas só vê as vielas,
a gente quer ser bem mais, mas só nos vêem favelas.
A gente não quer se esquecer, mas também não quer só estar nela.
A gente só quer ser só gente, como quem sente e não revela.
A gente seria mais gente, se nos reconhecessem mais belas.
Gente, sem rédia, sem pente, sem remédio, sem lente,
gente que só por ser gente, já bastasse o respeito,
já valesse a semente!

sexta-feira, 30 de novembro de 2018

Passadiço

Nossa paixão começou no inverno,
numa praça no jd. primavera,
me lembro quando você me olhou com olhos de verão
Eu que era todo outono, comecei a verdejar ali...
Um tempo depois estávamos nós de novo
numa praça na Guarapiranga,
aliás essa bendita represa sempre esteve entre a gente
empossando vinho e ressentimento, frustrações e enganos!
Idas e vindas, e foi em outra praça que te dei meu melhor beijo,
lábio cansado e quente, nossos olhos marginais miravam viadutos
e prédios sujos do centro antigo, nos despedimos sem sexo.
Mas quase 10 anos depois no largo da batata calhou de acontecer outro beijo
amassos e lágrimas, justamente numa praça,
lembro das luzes entrecortadas pelos galhos das árvores,
lembro de sua calcinha molhada e do beijo seco, quase rude...
Eu fiz o que pude, mas em nossa vida tudo praça, quase nada fica!