segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Unguento

Aguda a canção dos Agudás,
reverberando canções de retorno ao lar sobe o mar de lágrimas
Mas como se volta p'ruma casa desaprumada pelo tempo?
Como reinventar a liberdade? Como se reencontrar num presente sem pretensão.

Não se ensina o desalento, simplesmente preparam-se os unguentos
e o novo corpo reestabelece o novo mundo
e no fundo todos já sabiam voltar

terça-feira, 8 de julho de 2014

Nós

Notívago, eu, rompo a escuridão guiado por teu sorriso
que alumeia minhas vagas e alumbra meu vazio.
Tu vargas. velhas veredas percorres em mim
e abres novas picadas de puro verde e perfumas o jasmim.
Vagueio tua imensidão e me encaixo no espaço vago entre o racional e coração
e ali descubro o teu vermelho e devagar faço morada
e agora quando olhas no espelho também podes me ver
tua sombra me entrega e minha luz te projeta
somos por vezes a mesma voz, cada qual com sua especificidade,
mas ambos com a mesma sina com a mesma necessidade
de se juntar em uníssono imagem e poesia, alma e músculo
compondo aurora e crepúsculo na mesma hora, no mesmo lugar.

segunda-feira, 16 de junho de 2014

Aguado

Quis beber o mar,
por um instante imaginei
que debaixo da manta de espuma poderia te encontrar
numa prosa boa trançando os cabelos de Iemanjá

Quis beber o rio,
mas desisti do desvario
e quis ser canoa
em suas águas a deslizar
meu norte tua proa

Quis beber a chuva,
num pequeno momento no tempo
fui a gota paridera
se embrenhando no chão rachado da saudade
e fiz brotar em verde sua imagem,
seu sorriso...

Sentir a seca da tua falta me rasgando a terra
me fez querer beber toda água do mundo,
mas lá fundo, bem lá no fundo eu já sabia
que nenhum um açude me traria
a água doce dos teus beijos

sábado, 29 de março de 2014

Claudia


Eu fui arrastado,
e nesse arrasto mais de 514 anos vieram comigo
Camburão, jazigo, descaso, destino...
Arrastaram ela ainda viva,
ainda ela, ainda negra, ainda pobre
Toda uma sociedade arrastada por séculos de iniquidade
Arrastaram Claudia e me arrastaram também
e foram os mesmos homens que arrastaram
meus tataravós para as senzalas
Claudia, leite nenhum levou para casa àquele dia
deixou 4 meninos de barriga vazia

perdidos

como a bala que acertou a mãe.




Em honra a Claudia Silva Ferreira

quarta-feira, 19 de março de 2014

Cancelas, veredas e paixões

À mim cabe o tempo assistir
hoje depois da revoada de paixões
minha razão sabe sentir

hoje me cabe plantar sementes de amor
e espreitar o flor(e)cimento
Tranquilamente intranquilo
como Zambeze, o rio, infestado de crocodilos

Hoje me cabe cheirar o vento e ver o valor
de quem se encoraja a saltar minhas cancelas
viajar em minhas veredas
ver minha profundidade e meu vazio
bem de perto

Hoje quero viver o arrebatamento
o desvario do sentimento que se espraia em mim
eu não desisti de amar,

hoje quero, mais do que nunca
o prazer de cada vão momento
destilar poesia, ainda que em tempos de guerra

à mim cabe esperar que alguém me invada
se amalgame e ame, tatue-se nas brenhas do meu coração
quero sombra pra descansar sem assombro

à mim cabe a dor dos corações partidos,
dos quereres que findaram sem começar
meu carmas e minhas quimeras
vêem de outros tempos, outras eras

Porém, esse mesmo tempo também me rendeu a sanha
de sempre reassanhar a cabeleira e seguir
fermentando o que me cabe, o que me coube com o passar dos anos
meu vinho não ei de beber sozinho

Nova vida, novos planos, velhos sonhos
eu não desisti de mudar o mundo
eu ainda acredito na arte
E hoje sei que isso não é nenhuma ingenuidade

Amanhã me cabe o futuro
essa encosta de morro
onde ninguém nunca permanece muito tempo
sem virar passado

almejo o que almejam as flores
espalhar beleza em qualquer terreno
sob o lixo, sob o feno, ao natural ou com veneno

Almejo vida que me despetale, que me traga feridas,
mas que nunca me tire o poder e o pudor,
de ainda sem voar,
roubar o beijo do beija-flor

(Daniel Fagundes - Recife - 19/03/2014)

segunda-feira, 17 de março de 2014

Diz´tante

Queria ver-te, verter-te
Te ventar, reinventar-te
Queria contigo estar, te dar um start
te tombar, lambuzar-te
te ter toda em arte
comigo longe
em qualquer parte
queria poupar-te de minha falha presença
e só admirar-te
sequestrar-te sem recompensa
Sabes de onde sou? Eu sou de marte
e daqui de cima vejo a tua rua
Por isso não deixe de esperar-me
Pois logo menos te levo à lua

sábado, 8 de março de 2014

Outros carnavais


Somos feitos do mesmo asfalto,
mas também de lama de mangues e florestas
somos o efeito das festas dos candombes, de reizados e afoxés
Tu traz na pele um cheiro doce... seriguela com café
e um jeitinho de menina bagunceira que mijou no próprio pé
eu trago o fogo nos abraços, lábio quente
e faro esperto à te cheirar
Somos feitos de partidas e encontros
de salivas, suor e muito mais
do agora que me inunda de você
que venham outros carnavais