quarta-feira, 8 de julho de 2009

De mim

Sobre os escombros de vida, margaridas.
Almas falidas são ventos distantes
aos errantes vendavais de corações libertos.
Corre menino! Vai menina!
Inspirem a sina de estrelas cadentes ao beijarem o mar,
ensinem os velhos discrentes que ainda se pode amar,
diga as verdades sem medo que os adultos
não aguentam escutar...
Algodão doce no ouvido, formiga em caixa de fósforos,
para-quedas de sacola de mercado, bolinha de sabão.
Teime criança! Não aceite facilmente o meu não!
Não deixe que minha ansia de proteção apague sua chama,
continue levando escondido a lagartixa pra cama,
pois quem ama como pai se esqueceu do quanto é vivo
o fogo que arde dentro de ti.
Por isso queime: fogo, fagulha, faísca, fogueira...Queime!!!
E não mate seus sonhos mais belos
em lutas de video-game.


Para o eterno residente da morada do meu coração,
meu filho, João Bach Fagundes Gusmão.

Amante

Sinto falta de um amor possível,
ultimamente tem sido impossível a possibilidade de amar
cabeça cheia,
coração vazio,
de todas as fontes que bebo
em nada me sacio.
Mas em algum lugar deve existir
uma alma tão revolta quanto a minha,
dando linha pra pipa do futuro.
Espero que bons ventos
tragam seu mandado
pro lado de dentro do meu muro.

quarta-feira, 29 de abril de 2009

Pecado Capital

Decadência dos valores, amores brutos, os putos de esquina e sua sina libidinosa, os amantes do haxixe, os assassinos sem escrúpulo, os psicopatas e sua lábia venenosa, sim...os invejo, todos os boêmios, poetas de rua, os infratores da lei, aqueles que tomam a vida de assalto, admiro as peruas de salto alto caminhando na paulista, digo que não, mas também quero a modelo da revista...Ahhh inveja sem cura, dos filhos de Baco, adoradores do vinho, os cristãos rebeldes sem coroas de espinho, queria ser por um dia uma beata em sua santa castidade e na manhã seguinte ser uma vadia dando o cú de graça num cantinho, queria ser cão, ser gato, ser homem, ser flor, ser a eternidade, ser deus e ser diabo, ser pão, ser partilha, ser pastilha de hortelã, ser Bodelaire...derramando sua visceralidade lentamente sobre a folha branca da moral, somos tão puros dentro dessa nossa liberdade sem rédeas não? Somos isso, essa coisa feia e bela, essa agressão singela, e tem mais, aos militantes de plantão uma revelação: -Somos todos culpados, Che está morto amigo, faça sua revolução!!! A sociedade não seria outra se não assim, já é, já está feito, por mais dolorido que seja, a história não perdoará ninguém, não que todas as lutas até aqui tenham sido em vão, mas o que vale agora é saber o que faremos a partir de então... Apesar da cultura que tenho, do empenho em meio a literatura vasta, percebi que até minha negritude já não me basta, minha descendência indígena já não é escudo, meu RG foi queimado num ritual pseudo-pagão e eu estava mudo. E assim desprotegido de mim, escavei os segredos encobertos em minha identidade e escancarei minha culpa católica Européia, também tenho o sangue dos estupradores...Demorei, mas descobri o quanto pesa a cabeça tanta razão, o quanto aniquilei meus sentimentos na utopia cega da transformação, mas...transformar o que, transformar a quem e por que? A partir de agora estão expulsos de meu pensamento os que pensam em salvação, Ninguém precisa disso, na verdade sou eu quem vive em agonia, reparei sob os escombros da indignação que meu coração ainda batia, hoje, apesar da entrega aparente, faço auto-terapia pra perder o medo de amar. Por isso calem-se senhores da inverdade, engulam suas teorias, os do povo, os da academia, todos! Prefiro uma valsa solitária a beira do abismo, o mergulho em mim, pois não quero doutrinar ninguém, sigo meu caminho aquém das varizes sociais, bebo da água de esgoto que eu mesmo sujei, como do lixo que nós todos produzimos, e eu sei, é dolorido dizer isso, mas repito SOMOS TODOS CULPADOS!!! Sim, somos sim e não precisa disfarçar... Lembra você ECOchato, jogando aquele papel de bala pelo vidro do busão, lembra você revolucionário de merda batendo em sua mulher em casa, lembra você feminista panfletária escondendo a inveja da moça semi nua no cartaz de cerveja e você vegetariano padrão, cidadão modelo, fingindo não sofrer ao ver a picanha fritando na brasa, na cabeça a dor de uma cachorro em frente a máquina de frangos e no pé um tênis de uma marca qualquer que com certeza alimenta o capitalismo tanto quanto eu, e ainda assim se acha superior, acha que esta fazendo a reforma do pensamento...Assim considerando essa culpa evidente, podemos ao fim descobrir que não temos culpa de nada... Será?
Por tudo isso concluo: além da sociedade de classes, além dos muros, da disparidade dos discursos, talvez a única coisa que nos torne iguais seja a mãe de todos os pecados capitais, nossa majestade: A ignorância.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Árvore

Um dia me julgou infantil,
disse que eu não tinha rompido com o cordão umbilical
que me prendia a minha mãe.
Esbravejou de boca cheia dizendo ser independente,
mas escondia atrás do berro a menina sem rumo, a princesa decadente.
Eu mirava em ti o jardim vermelho de sonho utópico
onde as sementes floresceriam plenas numa linda primavera de praga.
O tempo passou e as flores murcharam.
Eu me descobri árvore, crescendo e pulverizando no ar
a minha contribuição pro futuro,
enquanto você sequer vislumbrava o que havia além do muro.
Pois é, não me desconectei da minha história,
você tinha razão, um forte cordão me liga a eterna pachamama
como toda árvore que se presa, com suas raízes bem fincadas no solo
com os braços levantados pro céu e a cabeça tocando as nuvens
o tronco ligando a razão ao imaginário,
muito diferente do campo binário onde você com você mesmo prefere viver.
Sim, sou árvore, maduro e consciente
sigo o caminho ancestral guiado pelos antepassados
com amor e não adornos, nossos velhos são sábios por natureza
e nossa beleza não é plástica.
Sua morte alimenta a existência do meu povo,
seus nutrientes enfermos são suavemente filtrados por nossas raízes.
Riqueza, jamás, só o básico pra continuar a partilha.
E assim quando a trilha me chamar pro além mais,
morrerei de pé, definhando até a última folha
e reciclando tudo que meu corpo puder doar
pra quem quiser, pra quem rasgar...
o sublime ventre da mãe terra.

segunda-feira, 23 de março de 2009

DIVINALUZ

E Deus disse:
-Haja Luz!!!
E Luzcifer...

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Sujeito oculto

No começo eu não queria acreditar, olhei pro meu corpo e fingi não ter entendido, não era possível que tivessem feito aquilo só por causa de uma olhada. No fundo, eu sabia desde aquele instante, mas foi difícil, imagine que depois do acontecido eu fui tentar explicar pro povo que eu não tinha feito por mal, foi só uma olhadinha sem compromisso, ela era linda e eu não sabia que estava acompanhada, ninguém me deu atenção, eu parecia não existir pra ninguém ali. Poxa, no meio daquele calor, cuíca, pandeiro, agogô, umas breja na cabeça... o suingue dela me ipinotizou e acabou dando no que deu, enfim demorei, mas compreendi, era samba, era favela era a mulher do Cirílo e ele tinha que cobrar a treta, ia ficar tirado na quebrada se por um acaso alguém visse que eu tinha olhado pra sua mulher, o que iam dizer na biqueira no dia seguinte? Porém foi um pouco exagerado né? Podia ter me dado umas porrada e já era, teria sido suave, uma surra em troca de um sorriso "e que sorriso", ainda bem que ele só viu eu olhando pra ela e não ela também olhando pra mim, pois se assim fosse tinha sobrado pra ela também, menos mal teria sido uma surra em troca de um sorriso, nada de novo só o que a vida já faz com qualquer um dessa quebrada diariamente, uma surra em troca de um sorriso. Mas não foi assim, o desgraçado sacou o trabuco e foi pipoco o medidor da treta, foi feita a merda, o samba parou, a rapa saiu correndo, instrumentos caindo no chão...que pecado! Comigo tudo bem, qualquer coisa eu topo, mas aquele dia o pandeiro foi maltratado, tamborim descompassou, o surdo ficou surdo com o estampido da bala, a dança, a reunião de gente em melodia comum foi interrompida, o samba não pode ser tratado desta maneira, jamás!!! Essa foi minha maior dor naquele momento, essa foi minha minha maior perda...
Depois daquele dia o samba demorou a voltá, a polícia ficava urubuzando a área e a galera ficava com medo, eu que já era marrento, depois daquele dia fiquei mais ainda, peitada os cusão e mandava corrê, mas num surtia muito efeito, eu fiquei meio invisível depois daquela noite, todo mundo passava desapercebidamente por mim e pouco me davam aouvido, a mulecadinha que jogava bola na ruinha de trás, ali sabe, onde a frieira encontra a guia, onde a gritaria faz todos parecerem mais vivos, nem ali eu era notado. Mas de tanto infernizar indo na casa dos sambistas toda noite, eles acabaram se enchendo. Foram devagarindo chegando no terrero, voltou meio tímido o batuque, mas voltou e graças a mim. Tá certo que as vezes eu tinha que pegá na mão do Zeca quando o tamborim parecia tá meio devagar e dava energia pro negócio, o coitado até suava frio, as vezes o surdo ficava fraco e eu grudava na baqueta e ajudava a porrada do Zezinho ser mais ritimada, assim seguia toda noite de sexta e sábado, eu como já era de praxe nunca era lembrado, mas vira e mexe ouvia alguém dizer pra algum dos músico: - Hoje você tava inspirado hein?! E o pior era as resposta dos ingrato dos músico dizendo: - Sei lá, senti uma força vindo num sei de onde e me tomando o corpo, tá forte o samba hoje! Era assim, mas tudo bem, ali a única majestade tinha de ser a música.
Todo mundo ia embora lá pras hora que amanhecia, lá pras hora que o pé da judite, a passista mais nova começa a doer, eu podia ficar ali por séculos, mesmo vendo todo mundo ir embora sem me comprimentar, mesmo vendo um falando mal do outro pelas berada, era ali minha morada meu recanto sagrado. E se quer saber, depois de tudo sozinho no terrero é que eu sentia a melhor parte do momento, aquele bafo quente misturado com a poeira do chão, aquela atmosfera de paz deixava guardado no ar os melhores sonhos das pessoas que por ali tinham passado, parece que só eu via aquilo. Até que um dia enquanto o Tijuca chamava a saidera no samba, eu vi a dona Sofia no meio da multidão, tava olhando pra mim, logo ela mãe do Cirílo ele que tinha tornado minha vida naquele descaso, ela benzedera das arruda do barranco, logo ela!!! Pensei, será que tô fazendo algo de errado? Fui até ela e me ajoelhei, pedi bença, ela disse: -Deus te abençoe meu filho. Fiquei muito emocionado, foi a primeira pessoa que falou comigo depois daquele dia fatídico no samba, eu já tinha até me acostumado com o meu pecado, com a minha exclusão, parei o samba aquele dia e o samba parou minha vida, porém ali do lado daquela sábia mulher me senti de novo mais um da família, me senti perdoado sem que ela dissesse uma palavra a mais, o olhar dela erradiava luz e me dizia algo que eu mesmo sem entender sabia que era bom, aquele dia eu fui embora do samba mais cedo.

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Ruínas de Gente

Do pó viemos,
ao pó voltaremos
Se for fogo queimaremos,
se for água beberemos...
No fim uma coisa só
poeira de vida, reconsumida, renascida
Veremos, é o fim de todos
sem amos, sem remos
no silencioso mar
de infinito sem contorno
o eterno devir, o eterno retorno